Querido Gustavo,
Respondo, finalmente, as questões
que me foram apresentadas por você. Se puder, publique a resposta em seu blog.
Resolvi recortar as questões e respondê-las uma a uma.
“Uma das suas primeiras
assertivas, que a mim causou muito espanto e preocupação, foi a de que
“precisamos nos despir dessa arrogância de que nós somos proprietários da
verdade suprema”. De fato, “donos” da verdade nós não somos. Mas nós a
conhecemos! A Verdade é Cristo, e não há outra”.
Gustavo, a Teologia nos ensina
que a Plenitude da Revelação é Cristo, mas esta plenitude não significa
esgotamento da verdade. Os desdobramentos desta verdade estão em todos os
lugares do mundo. Deus continua se revelando. Plenitude não significa
finalização.
O que sabemos do Cristo é
processual. É assim que o Espírito Santo trabalha na vida da Igreja. A Teologia
está a caminho. A grandeza da Revelação não cabe nos documentos que temos, nem
tampouco na Teologia que já sistematizamos. O dogma evolui, pois é verdade
santa. Tudo o que é santo, movimenta, porque é vivo. O que alimentou o passado
precisa continuar alimentando o presente, e o futuro. Não significa modificar a
verdade, mas sim, à luz do Espírito e da autoridade da Igreja, buscar a
interpretação que favoreça o conhecimento da verdade que o dogma resguarda.
Este exercício eclesial manifesta ao mundo o zelo pela verdade que nos foi
confiado cuidar e administrar.
Deus continua se revelando ao
mundo. O limite da Revelação é a inteligência humana. Nós o vitimamos
constantemente com nossas reflexões, mas mesmo assim, Ele não deixa de se
manifestar. Onde houver uma brecha, lá Deus acontecerá. Não podemos nos
esquecer que a salvação é oferecida a todos. É interesse amoroso de Deus que a
humanidade o conheça.
Nós, enquanto proprietários desta
verdade que é Jesus, cuidamos do que recebemos. O cuidado da verdade recebida
está sustentado sobre dois pilares. Anúncio e Reconhecimento. Nós anunciamos o
Cristo. Nisso consiste a ação evangelizadora da Igreja. Mas nós também
reconhecemos a sua presença, indícios do sagrado, em outras religiões. Como
reconhecemos? Através dos frutos que produzem.
O amor que temos ao Cristo deve
ser suficiente para que saibamos respeitar tudo o que é cristão, mesmo que as
pessoas não se reconheçam cristãs. É dialética, meu caro. É a tensão
escatológica que também esbarra na hermenêutica cristã. Já, mas ainda não. É
neste ainda não que nos abrimos com humildade para compreender que outras
religiões também vivem e perseguem os rastros do sagrado, e que mesmo oculto,
lá o Cristo já está sendo vivido. É uma questão de tempo.
Recordo-me de uma frase muito
sábia, que um grande professor jesuíta costumava repetir em nossas aulas de
mestrado. Ele dizia: “todo mundo tem o direito de viver o seu antigo
testamento.” A administração desta verdade só pode ser responsável, à medida que
reconhecemos que ela já ultrapassou os limites dos muros, que estão sob nossa
custódia.
“E como explicar que, ao falar
da condição adâmica do homem, o senhor tenha adotado a interpretação modernista
segundo a qual a historicidade das escrituras fica reduzida ao nível das
histórias da carochinha?! Dizer que Adão é uma imagem simbólica, metafórica,
“fabulesca”, não faz parte da Doutrina Católica! O fato de a linguagem
empregada no livro de Gênesis ser recheada de simbolismo não elimina o fato de
que os acontecimentos nele narrados tenham se dado no tempo e no espaço tal
como foram escritos. A interpretação literal complementa e enriquece a
hermenêutica que se pode fazer a partir dos símbolos. Não é assim que ensina a
Igreja?”
Não, não é isso que ensina a
Igreja. Se você frequentasse os meios teológicos saberia muito bem que a
linguagem metafórica nem sempre está a serviço de um fato concreto, pontuado no
tempo e no espaço. Por isso é metáfora.
A linguagem metafórica não é
mentirosa. Sou professor universitário e ensinei Antropologia Teológica. É uma
clareza que não posso perder de vista. Ao falar da condição adâmica nós
precisamos pensar na humanidade como um todo. Não temos a certidão de
nascimento de Adão. O que temos é a fé de que Deus criou a humanidade. Não
posso pontuar a existência do primeiro homem. A sagrada escritura só que nos
ensinar que somos filhos Dele.
Gustavo, toda a Antropologia
teológica é construída na perspectiva da Cristologia. A narração das origens
está diretamente ligada ao evento crístico. A Teologia da Criação não é uma
ciência exata. O que precisa ser assegurado é o fato de que Deus é o criador do
Universo. A maneira como tudo isso se deu é metáfora. Isso não significa meia
verdade, nem tampouco conto da carochinha. O que não pode ser relativizado é a
entrada de Jesus na história.
Há um destino Crístico que nos
foi oferecido (Soteriologia). Jesus é histórico. Está situado no tempo e no
espaço. Isso sim é fundamental para a fé. Quando a Sagrada Escritura narra o
nascimento do primeiro homem, o grande objetivo não é pontuar o início da vida
humana, mesmo porque o escritor sagrado não escrevia com essa finalidade. Volto
a dizer. A exegese nos ensina que o escrito tem como principal objetivo
salvaguardar que o princípio de todas as realidades criadas está em Deus
(Criacionismo). É por isso que a fé não se opõe à ciência no que diz respeito à
evolução (Evolucionismo). É simples. O primeiro homem criado não pode ter tido
a experiência que a sagrada escritura relata. Ou você pode desconsiderar todos
os conhecimentos a respeito da origem do ser humano?
Gustavo, a fé não é um conjunto
de certezas, meu caro. Não temos provas concretas para muitos aspectos da fé
que professamos. Se as tivéssemos não precisaríamos ter fé. Acreditamos no que
não vemos. Nem por isso é “conto da carochinha”, como você sugere.
Não sei se você a conhece, mas se
não conhecer, sugiro que tenha contato com a obra do americano Joseph Campbell,
que de maneira brilhante e pertinente, fez uma análise da linguagem mitológica
nas culturas. Na primeira parte da obra “O poder do mito”, ele fala justamente
deste grande equívoco que costuma ser muito comum entre as pessoas que não
transcendem a linguagem. Campbell é uma das maiores autoridades no campo da
mitologia, pois faz uma abordagem semiótica destas narrações. O mito não é uma
mentira, mas também não precisa ser verdade, diz ele. O importante é a fé que
ele sugere. O importante é reconhecer que ele está a serviço de uma verdade
superior, porque não cabe no tempo. Foi mais ou menos isso que desejou
Guimarães Rosa, ao escrever o conto “ A terceira margem do rio”. Onde fica a
terceira margem?
O mesmo não se dá com as nossas
convicções religiosas? O discurso religioso é o discurso da terceira margem.
Guimarães Rosa compreendeu bem esta linguagem. E nós precisamos compreendê-la
também.
“Depois o senhor falou que
durante muito tempo “nós (subentenda-se: Igreja) fomos omissos”. Parece-me que
essa omissão se referia às questões ecológicas. Pelo amor de Deus, padre! A
missão da Igreja é salvar a Amazônia ou salvar as almas? Que conversa é essa de
“cristificação do universo ”? Por que dar atenção a isso quando tantas almas se
perdem na imoralidade, na heresia, na inércia espiritual?”
Gustavo, sua visão soteriológica
é muito estreita. Salvar almas, somente? Essa visão compartimentada do ser
humano é herética. Precisamos salvar a totalidade do humano, meu caro. Esqueceu
o postulado fundamental da Antropologia cristã? Somos corpo e alma. Unidade. É
só ler Tomás de Aquino, Santo Agostinho.
Fazer uma pregação desencarnada?
A alma que quero salvar tem corpo, sente frio, tem fome, medo. A alma que quero
salvar está num corpo que morre antes da hora, porque sofre as consequências de
um meio ambiente marcado pelo pecado da omissão.
Se você fala da inércia espiritual,
a Igreja fala da inércia espiritual e corporal. Cuidar do mundo é dar
continuidade ao milagre da criação. Somos “co-criadores”. Deus continua
criando, e nós correspondemos com a experiência do cuidado. Criar é atributo
divino, mas cuidar é atributo humano. A horizontalidade da fé é real, concreta.
Isso é Teologia da Criação. Está nos livros fundamentais, no catecismo da
Igreja e também nos ensaios teológicos mais arrojados.
Quanto à essa conversa de
“Cristificação do universo”, que você pareceu banalizar, fazer menor, é apenas
uma interpretação belíssima da presença de Cristo no mundo, tomando posse de
todos os lugares, mediante o movimento sacramental que Igreja celebra e
propaga.
Todos os sacramentos que a Igreja
celebra nos cristificam. O nosso comprometimento com o Cristo, mediante o
processo de conversão, nos cristifica. O gesto de caridade nos cristifica. A
oração nos cristifica. Ser cristão é ao Cristo estar configurado. É boba essa
conversa?
“Em seguida, veio aquela
colocação, esdrúxula e totalmente non sense, de que a Igreja – que se
considerava barca de Pedro – após o Concílio Vaticano II passou a se enxergar
como Povo de Deus. Devo informar-lhe que a Igreja permanece sendo barca de
Pedro, e o povo de Deus é – por assim dizer – a tripulação desta barca. Onde é
que houve mudança na compreensão da eclesiologia”?
A colocação esdrúxula não tem
outro objetivo senão ensinar a busca que a Igreja tem feito de ser “Católica”.
Você bem sabe que o significado de ser católica é ser “universal”. A expressão
“barca de Pedro” não foi banida, Gustavo. Eu falei de superação conceitual. O
problema não é a expressão, mas a interpretação que podemos fazer dela. É uma
questão hermenêutica. A expressão “Povo de Deus” sugere a universalidade que a
Igreja quer e precisa ter. O concílio Vaticano II compreendeu assim. É
orientação da Igreja. Eu não inventei isso. Toda essa aversão que você tem ao
Ecumenismo expõe uma fragilidade na sua reflexão. Não é blá, blá, blá, como
você costuma dizer. A Igreja trata com muito cuidado esta questão, pois sabe
que as questões religiosas estão sendo causas de muito conflito no mundo.
Banalizar a dimensão ecumênica da Igreja é, no mínimo, irresponsável.
Há uma vasta literatura na área
da Eclesiologia refletindo sobre esse tema. Sugiro que você a conheça. Só vai
lhe enriquecer.
Meu filho, o importante é a gente
não esquecer, que mesmo estando na barca de Pedro, é sempre cordial e cristão,
acenarmos com carinho e respeito aos que estão em barcas diferentes. As grandes
guerras atuais são movidas por essa incapacidade de aceno.
“Entre as críticas feitas
pelos blogueiros, salientava-se a sua posição – no mínimo, omissa – quando o
apresentador Jô Soares comentou que achava um absurdo que a Igreja considerasse
que o matrimônio servia apenas à procriação. Pergunto: por que o senhor não
afirmou, como ensina a Igreja, que o matrimônio tem duas finalidades: a unitiva
e a procriativa? Por que não disse que , sim, o amor dos esposos importa e ele
é – ou, pelo menos, deve ser – expresso pela unidade (de pensamento e de
vontade) que os cônjuges demonstram em todas e cada uma de suas ações? Era tão
simples desfazer a argumentação errônea do entrevistador e, ao mesmo tempo,
aproveitar para instruir as pessoas segundo a Sã Doutrina!”
Concordo com você. Eu errei ao
não ter usado os termos técnicos. Quis levar a discussão através de outros
recursos e acabei não sendo claro como deveria.
“Pior que não ter ensinado no
momento oportuno, foi o senhor afirmar que “o nosso discurso já mudou”!
Diga-me, Pe. Fábio, acaso a doutrina imutável da Igreja perdeu a sua
imutabilidade? O senhor crê, convictamente, que a Igreja está, dia após dia, se
amoldando à mentalidade atual? Não seria missão da Esposa de Cristo formar na
sociedade uma mentalidade cristã, isto é, fomentar um novo modo de pensar e de
viver que esteja impregnado do perfume de Cristo? Ou é o contrário: o mundo é
que deve catequizar a Igreja?”
Não, não é a Igreja que precisa
ser moldada aos formatos do mundo. Em nenhum momento alguém me viu pregar sobre
isso. Quando eu disse que o discurso já mudou, eu me referia justamente à visão
antiga que ele tinha do “sexo no casamento”. O apresentador desconhecia a
reflexão a dimensão unitiva do sexo na vida do casal.
“Em outro momento da
entrevista o senhor afirmou que não “conseguia” celebrar a missa todos os dias?
Não lhe parece estranho, e prejudicial, que a sua “agenda” não permita que o
senhor celebre todos os dias a Eucaristia? Qual deve ser o centro da vida do
sacerdote: o altar ou o palco? E quanto ao breviário? A sua “agenda” permite
que o senhor o reze diariamente (considerando que não fazê-lo é pecado grave
para o sacerdote)?”
Gustavo, quanto ao zelo que tenho
pela minha vida de padre, gostaria de lhe tranquilizar. Não sou um aventureiro.
Sou um homem responsável, e se tem uma coisa que não perco de vista é a
maturidade humana. Se me conhecesse, talvez não incorreria no julgamento velado
de suas palavras.
Deus conhece a vida que tenho, e
conhece também minha dedicação aos seus projetos. Se você gosta de quantificar
o que faz, este não é o meu caso. Eu sou filho do Novo Testamento. Jesus é o
Senhor da minha vida. Com Ele eu aprendi que a salvação não está na obrigação
dos ritos, mas na qualidade do coração que temos. Busco cumprir todas as
obrigações que a Igreja me pede, mas não coloco nisso a certeza da minha
salvação. Não sou rubricista, nem pretendo me tornar. A Igreja nos recomenda
muitas coisas. Lutamos para cumprir tudo. O que não conseguimos, deixamos nas
mãos de Deus. Só Ele poderá nos julgar.
“Depois veio a pergunta: “o
senhor teve experiências sexuais antes de ser padre?” Creio um homem que
consagrou (frise-se o termo: consagrou) sua sexualidade a Deus não deveria
expor sua intimidade diante do público. Mas, já que a pergunta indecorosa foi
feita, a resposta que esperei foi algo no sentido de fazer o interlocutor
entender que aquela questão era de ordem privada; que não convinha ser tratada
em público. Em resumo: algo como “não é da sua conta!”. Porém, que fez o
senhor? Respondeu que teve, sim, experiências sexuais precedentes, mas “às
escondidas”! Caro Pe. Fábio, o senhor acha que convém dar uma resposta deste
tipo? Isso não induziria as pessoas a pensar que não existem padres castos
(considerando que muitos confundem castidade com virgindade)? Isso não estimularia
as pessoas a crer na falácia segundo a qual todo jovem já teve, tem ou deve ter
experiências sexuais que precedam a sua decisão vocacional?”
Gustavo, a vida é o testemunho
que temos. Não tenho dificuldade alguma de responder às perguntas que me expõem
como homem. Não fiquei padre por acaso. Tenho uma história e dela não fujo. São
Paulo não fez o mesmo? Leia as cartas que ele escreveu. Ele sempre fez
referência à vida vivida. Em nenhum momento se esquivou de contar sua história,
mas fez dela um instrumental para orientar e sugerir vida nova em Cristo. Não
gosto da expressão “não é da sua conta”. Se eu me disponho a ser entrevistado
por alguém, tenho que saber que a minha vida será a pauta. Só não admitiria o
desrespeito, mas isso não ocorreu. Não vou mentir para o povo. Nas minhas
pregações eu falo o tempo todo da minha vida. Não quero bancar o santo. Eu
quero é ser santo.
“O senhor comentou, ainda, que
“para a gente ser padre, a gente tem que ter amado na vida”. “É impossível
(grifos meus) fazer uma opção pelo celibato, pela vida consagrada, se eu não
tiver tido uma experiência de amar alguém de verdade”. O senhor acha,
realmente, que o homem que nunca amou uma mulher não sabe amar? Baseado em que
o senhor diz isso? Que dizer então do meu pároco que, tendo ido para o
seminário aos 11 anos, nunca namorou? Ele é menos feliz por causa disso? Menos
decidido pelo sacerdócio? Não creio que isso proceda.”
Digo baseado no fato de ser
padre, conviver com padres, morar em seminários desde os 16 anos de idade, ser
diretor espiritual de inúmeros seminaristas, padres e freiras. Digo isso porque
vivo os bastidores da Igreja. Sou amigo pessoal de muitos bispos, religiosos,
diretores de seminários. Tenho 38 anos e sou profundamente interessado pela
vida sacerdotal. A minha experiência, e a de tantos que passaram pela minha
vida, mostraram-me que o celibato é ESCOLHA. Para haver escolha é preciso que
haja possibilidades. Quanto à felicidade de seu pároco, sobre ela não posso
dizer, pois não o conheço. Minha fala é fruto do que a vida me mostrou, e só.
“O que se viu nessa malfadada
entrevista à rede globo foi a apresentação de um comunicador, um cantor, um
filósofo, um homem qualquer. Pudemos enxergar Fábio de Melo. E só. O padre
passou desapercebidamente. De comunicadores, cantores e filósofos, já basta:
nós os temos em número suficiente! Precisamos de padres! Padres que são, sim,
homens por natureza; mas que tiveram sua dignidade elevada pelo caráter
impresso no sacramento da Ordem. Homens que não são “como quaisquer outros”
porque receberam a graça e a missão de agir in persona Christi. Temos carência
de ver padres que ajam, falem e – até mesmo – se vistam, em conformidade com a
sua dignidade sacerdotal.”
Gustavo, se os seus olhos me
enxergaram como um “homem qualquer”, perdoe-me. Talvez eu não tenha conseguido
revelar a você a sacralidade que move os meus objetivos. Talvez você esteja
elevado demais em sua vida espiritual, e necessite de padres mais
espiritualizados, menos humanos. Tenho consciência que ninguém precisa ser
unanimidade. O que sei é que na Igreja de Cristo há um lugar para um padre com
o meu perfil. Eu vejo a obra que Deus tem realizado na minha vida e na vida de
tantas pessoas que se identificam com meu trabalho.
Meu filho, eu tenho encontrado
pela vida as dores do mundo, e com elas tenho me ocupado. Demorei responder a
sua carta justamente por isso. Tenho gastado o meu sangue nesta proeza de ser e
agir “in persona Christi”. Não tenho outro objetivo senão tentar atualizar a
presença de Jesus na vida das pessoas. Eu o faço como posso. Evangelizo a
partir da teologia que amo, mas também a partir da experiência que me guia.
Conheci a Deus através do amor ágape. Fiquei fascinado quando me ensinaram que
Deus é um pai amoroso que não despreza os filhos que tem, mesmo quando não
correspondem ao que Ele espera.
O banquete em sua casa está
sempre posto, pronto para receber o filho que tem fome. Adentrei a morada de
Deus assim, na condição de homem qualquer, mas o surpreendente é que Ele não me
recebeu como homem qualquer. Recebeu-me com festa, com carinho, com
misericórdia, pois é capaz de me enxergar para além de minha aparência. É isso
que tenho feito, meu caro. Tenho me esmerado para convencer as pessoas de que o
mesmo pode acontecer com elas.
Quanto à minha dignidade
sacerdotal, esta eu costumo preservar através das minhas atitudes. Minha roupa
de padre não me garante muita coisa. O sacerdócio que o povo espera de mim não
está no hábito que ostento, mas na sinceridade que preciso ter diante do meu
compromisso assumido. Zelo para que Deus não seja transformado numa caricatura
qualquer.
“Creio que muitos destes
desdobramentos que eu estou expondo não foram sequer imaginados pelo senhor no
momento em que concedeu a entrevista, e enquanto respondia às perguntas.
Contudo, o ônus de quem se expõe à opinião pública é, exatamente, suportar os
possíveis mal-entendidos que se geram quando as palavras são compreendidas de
modo diverso da intenção e da mentalidade de quem as proferiu. Espero que tudo
que eu falei aqui tenha sido realmente um grande mal-entendido… Sempre cabe,
contudo, esclarecer os desentendimentos mais graves que possam prejudicar não
só a sua imagem, mas a da Igreja como um todo. Um ensino errado pode levar uma
alma à perdição.”
Querido Gustavo, como professor
de Hermenêutica eu não tenho dificuldade com os que pensam diferente de mim.
Não é nenhum crime termos diferenças. O problema é quando nós fazemos da
diferença um motivo de pré-julgamento e acusação.
“Perdoe-me, sinceramente, a
franqueza e, talvez, a dureza em alguns momentos. Mas eu precisava lhe expor as
minhas dúvidas, impressões e inquietudes com relação a essa entrevista. Se o
senhor se dignar me responder esta carta, ainda que de modo breve, sucinto,
ficaria imensamente grato. Despeço-me rogando mais uma vez a sua bênção e
garantindo-lhe as minhas orações em favor de seu sacerdócio e de sua alma.
Gustavo Souza, Indigno filho da Santa Igreja Católica”
Perdoo, é claro que perdoo,
afinal, este o meu ofício. Como padre eu sou ministro da reconciliação.
Confesso que a ira de seus seguidores, blogueiros que acompanham os seus
escritos, me feriu muito mais que suas indignações. E é sobre isso gostaria de
dizer, ao final desta resposta. Não sei quem é você. Vi a sua foto, aquela em
que você diz estar embriagado de Coca Cola, e nada mais. O pouco que sei de
você está revelado nos textos do seu blog. Tenho acompanhado seus constantes
combates, esforços para diminuir as heresias e afrontas à Igreja. Admiro o seu
zelo. Ele expressa o amor que você tem a Deus. Mas confesso que sinto falta de
“misericórdia” em suas falas, meu caro.
Gustavo, não faça do seu amor à
Igreja um obstáculo ao seu amor pelos mais fracos, pelos diferentes. Defenda
tudo o que quiser defender, mas não permita que o seu discurso seja causa de
contenda e inimizades. Há sempre um jeito de discordar sem precisar ofender. A
ofensa faz crescer o que é diabólico.
Cuidado com as generalizações.
Você tem combatido as CEBS. Cuidado. Há muita gente honesta nestes movimentos.
Eu as conheço. Vi de perto o trabalho frutuoso, espiritual, humano, salvação
total acontecendo em muitos lugares deste grande Brasil. Vi nomes sendo citados
de forma banal, irresponsável. Irmã Doroty morreu defendendo o evangelho, meu
filho. Gostando você, ou não, ela é foi uma mulher comprometida com as causas
de Jesus. É muito triste ver o nome dela citado no seu espaço, como se fosse
uma “mulher qualquer”. Chico Mendes foi um homem que defendeu questões nobres.
Só por isso já merece o nosso respeito. Frei Beto é um homem fabuloso. Já fez
muita gente se aproximar de Deus, por meio de sua inteligência e sabedoria
aguçada.
Não limite o seu blog a um lugar
de combates. Que seja um lugar de discussões, mas que sejam feitas à luz do
princípio fundamental que o evangelho nos sugere: o amor ágape.
Gustavo, aproxime-se cada vez mais do Coração de Jesus. Ele é a interpretação
da verdade que tanto buscamos compreender. Deus está inteiro em Jesus. O grande
desafio da conversão é aproximar a nossa humanidade de sua divindade.
Do Adão que há em nós ao Cristo
que nos foi oferecido. Mesmo estando em estágios diferentes, uns mais à frente,
outros mais atrasados, não importa. O importante é que saibamos ir juntos.
Nossa salvação depende disso. Uma coisa é certa, meu caro. Todos nós estamos
desejosos de acertar. Sigamos juntos nesta busca.
Com meu carinho e benção,
Pe. Fabio de melo.